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Procura-se um Jesus para a minha ideologia!

  • Foto do escritor: Paulo Magalhães
    Paulo Magalhães
  • 29 de abr. de 2018
  • 6 min de leitura

Estava lendo o livro Cartas de um diabo a seu aprendiz do C.S. Lewis nesses últimos dias - geralmente eu leio 2 cartas enquanto estou indo ou voltando da faculdade no metrô - e o demônio Maldanado escreve ao seu sobrinho-aprendiz Vermelindo sobre um assunto muito importante que eu já vinha pensando sobre, mas que não tinha desenvolvido um raciocínio completo ainda: o perigo (e no caso dos demônios da história, a vantagem) da tipificação de Jesus. Lewis escreve esse livro durante a Segunda Guerra Mundial, período onde as ideologias estavam borbulhando ao redor do mundo, mas principalmente na Europa e Estados Unidos. É a narrativa dividida em cartas fictícias de um demônio veterano ensinando ao seu aprendiz técnicas e estratégias para tentar e levar um homem à perdição.


Se repararmos bem, de tempos em tempos, na história recente da humanidade, Jesus sempre foi levantado como ícone de algum movimento sociopolítico. O exemplo mais antigo que consigo me lembrar agora é o de Jesus como um ícone do movimento Hippie. Um homem que veio ao mundo para espalhar uma mensagem de paz e amor. Um beberrão que andava com prostitutas e ladrões em nome do amor. Ou o movimento Punk que levantou Jesus como ícone da revolução. Um homem revolucionário que lutava contra um sistema e que foi duramente reprimido. Antes disso, e agora novamente, temos um Jesus comunista, que dividia o pão com o próximo e ensinava a repartir seus bens com os demais. Nos últimos tempos tenho observado a ideia de um Jesus anarquista, que lutava contra a tirania de um Estado e pregava que a comunhão entre os irmãos era mais que suficiente para gerar uma sociedade organizada, sem um poder ordenador acima dela. Tenho observado também a volta de um Jesus amigo de prostitutas, ladrões e outros grupos estigmatizados da sociedade, mas agora sob a bandeira do "politicamente correto" ou "modernismo".

É claro que estou sendo muito simplista nas tipificações acima que cada movimento dá a Jesus, e o meu objetivo não é denegrir as associações que criam para legitimar suas causas. Todavia, gostaria de apresentar os perigos por trás disso. Vejamos o que o demônio Maldanado diz em uma de suas cartas ao seu demônio-aprendiz: "Na geração passada, promovemos a construção de um tal 'Jesus histórico' em linhas humanitárias e liberais; agora, estamos estimulando um novo 'Jesus histórico' em termos marxistas, catastróficos e revolucionários. As vantagens dessas construções, que pretendemos mudar a cada trinta anos mais ou menos, são múltiplas. Em primeiro lugar, todas tendem a direcionar a devoção do homem a algo que não existe, pois todo 'Jesus histórico' é a-histórico (nunca existiu) [...]; cada 'Jesus histórico', portanto, deve ser extraído deles por supressão de um ponto e exagero de outro, e por esse tipo de suposição na qual ninguém apostaria cinquenta centavos na vida real, mas que é o suficiente para produzir um monte de novos Napoleões, novos Shakespeares e novos Swifts na lista de lançamentos das editoras" (Carta 23, p. 125).


Este é o primeiro perigo a ser discutido. Tudo o que precisamos saber sobre Jesus está nas Escrituras Sagradas, e ela só apresenta sobre Ele tudo aquilo que é essencial para as nossas vidas. Somente! Alguns amigos meus, o Matos e o Vinny, gostam de dizer uma frase que se encaixa muito bem no propósito deste post "texto fora de contexto gera pretexto". Um dos grandes perigos de todos os cristãos que possuem também uma ideologia política é tentar encaixar sua ideologia dentro das Escrituras Sagradas ou para legitimá-la ou para usá-la como meio de evangelizar. O que o demônio Maldanado fala para o seu aprendiz é que quando tentamos observar Jesus sob os óculos de nossa ideologia, vemos nada além daquilo que queremos ver. Se eu sou um liberal, verei apenas os pontos da vida de Jesus em que ele se comportou de modo liberal e negligenciarei o real propósito daquele comportamento de Jesus. Criamos então um Jesus tipificado, totalmente engessado na nossa ideologia. Servimos então a um Jesus que nunca existiu. Na verdade, é como servir ao deus "Ideologia" e colocar o nome desse deus de Jesus. Isso serve também para o Evangelho de Jesus. Quando lemos sobre o Evangelho visando justificar e legitimar nossos interesses privados, estamos servindo nada além do deus "Minhas Vontades" e colocamos o nome desse deus de Evangelho.


Se o primeiro perigo é sobre a desconstrução do propósito de Jesus na terra para legitimar as nossas ideologias, o segundo perigo é sobre a desconstrução da divindade de Jesus. E sobre esse objetivo maligno, o demônio fictício Maldanado revela ao seu aprendiz: "Assim, o negócio é distrair a mente do ser humano daquilo que Ele é e daquilo que Ele fez. Primeiro, fazemos dele tão somente um mestre", assim, o propósito dele, prossegue, "é destruir a vida devocional, substituindo a presença real de Deus, que pode ser experimentada pelos homens na oração e no sacramento, por uma figura meramente imaginativa, remota, sombria e boçal, de uma pessoa que falou uma língua estranha e morreu há muito tempo. [...] Em vez de o Criador sendo adorado pela criatura, você logo terá meramente um líder aclamado por um militante, e, por fim, um personagem ilustre aprovado por um historiador meticuloso" (p. 126). A construção de um Jesus hippie, punk, marxista, anarquista ou liberal cria apenas um líder ideal, e apaga todo o Seu propósito divino, uma vez que Ele não veio apregoar ideologias, mas as boas-novas, que são o Seu Evangelho. Da mesma forma, a tentativa de fundamentar ideologias dentro da Bíblia é como humanizá-la e transformá-la em um livro político-econômico, apenas com algumas informações extras sobre pecado, condenação, redenção, salvação e bons costumes. O terceiro perigo é sobre a transformação do Cristianismo em um meio para se alcançar seus princípios ideológicos, como se segue no livro: "Nós de fato desejamos, e desejamos ardentemente, fazer com que as pessoas tratem o Cristianismo como um meio; preferencialmente, é claro, como um meio para o seu próprio benefício, mas, se isso falhar, como meio para qualquer outro fim" (p. 127-128) menos para a glória de Deus e Seu plano para a humanidade. Por fim, sutilmente, e sem perceber, o diabo nos leva a pensar que vale a pena seguir a Jesus, não porque Ele deixou Sua glória e deu Sua vida em sacrifício por nós para que pudéssemos alcançar a salvação, mas porque certamente Ele era um anarquista, socialista, hippie ou revolucionário fora de seu tempo. De igual modo, ele nos leva a crer que vale a pena ler a Bíblia não porque ela é a Palavra de Deus, a Verdade dada a nós a qual temos como via de prática da nossa fé, mas porque nela posso fundamentar e legitimar as minhas ideologias. Percebam como a idolatria pode entrar sutilmente em nossas vidas se não estivermos firmados em Cristo. Idolatria porque a Ideologia assume o lugar de destaque em nossa vida e Deus é apenas o meio para que ela seja legitimada. No fim, servimos não mais a Deus, mas aos nossos princípios ideológicos.


Para finalizar, quero deixar claro que não condeno o fato de muitos de nós cristãos termos ideologias políticas, muito pelo contrário, é extremamente importante que nós estejamos ativos na vida política. Temos fartura de exemplos bíblicos de bons homens, tementes a Deus, que tinham uma vida política ativa, como Daniel e José. E muitas vezes uma linha ideológica pode nos ajudar a tomar decisões políticas para uma determinada sociedade. A intenção desse texto é unicamente de apontar os perigos de se usar a figura e a vida de Jesus ou a Palavra de Deus para fundamentar princípios ideológicos e legitimá-los, uma vez que nem Jesus e nem as Escrituras Sagradas foram entregues a nós por Deus para apregoar conjuntos de pensamentos ou visões humanas sobre o mundo (que é o que constitui as ideologias). Por fim, falei do ponto máximo de gravidade que esses tipos de associações e tipificações podem gerar em nossas vidas, a idolatria.


Que sejamos sábios e prudentes e que tenhamos discernimento para saber separar o que é conhecimento vindo de Deus e o que é puramente humano, bem como tudo aquilo também que parece humano mas que o fim último é glorificar a Deus. Encerro este texto com as palavras de Paulo e faço destas palavras as minhas: "Esta é a minha oração: Que o amor de vocês aumente cada vez mais em conhecimento e em toda a percepção, para discernirem o que é melhor, a fim de serem puros e irrepreensíveis até o dia de Cristo, cheios do fruto da justiça, fruto que vem por meio de Jesus Cristo, para glória e louvor de Deus" (Filipenses 1:9-11). Amém!

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